Meditação para a Quaresma - "Como Abraão, Maria aceitou a imolação do Filho..."

 "Antes que Abraão existisse, Eu sou"...

"...Certo dia, Cristo afirmou: "em verdade eu vos digo: antes que Abraão existisse, Eu sou!" (Jo 8, 58), e estas palavras surpreenderam os ouvintes, que objectaram: "Ainda não tens cinquenta anos e viste Abraão?" (Ibid., v. 57). Quem reagia assim, raciocinava de maneira meramente humana, e por isso não aceitava quanto Cristo dizia. "Acaso és maior que o nosso pai Abraão, que morreu? Os profetas também morreram. Quem é que pretendes ser?" (Ibid., v. 53). Jesus retorquiu-lhes: "Abraão, vosso pai, alegrou-se porque viu o meu dia. Ele viu e encheu-se de alegria" (Ibid., v. 56).


A vocação de Abraão, parece estar inteiramente orientada para o dia de que Cristo fala. Aqui, não contam os cálculos humanos; é preciso aplicar a medida de Deus. Só assim podemos compreender o justo significado da obediência de Abraão que, "esperando contra toda a esperança... acreditou" (Rm 4, 18). Esperou tornar-se pai de numerosas nações, e hoje sem dúvida alegra-se connosco porque a promessa de Deus se realiza ao longo dos séculos, de geração em geração.


O fato de ter acreditado, esperando contra toda a esperança, "foi-lhe creditado como justiça" (Ibid., v. 22), não só em consideração dele, mas também de todos nós, seus descendentes na fé. Nós "acreditamos n'Aquele que ressuscitou dos mortos, Jesus nosso Senhor" (Ibid., v. 24), condenado à morte pelos nossos pecados e ressuscitado pela nossa justificação (cf. v. 25). Abraão não o sabia; todavia, mediante a obediência da fé, dirigia-se para o cumprimento de todas as promessas divinas, animado pela esperança de que estas se realizassem. E existe por ventura maior promessa do que aquela que se cumpriu no mistério pascal de Cristo? Verdadeiramente, na fé de Abraão, Deus todo-poderoso entreteceu uma aliança eterna com o género humano, e o cumprimento definitivo dessa é Jesus Cristo. O Filho unigénito do Pai, da sua mesma substância, fez-Se homem para nos introduzir, mediante a humilhação da Cruz e a glória da ressurreição, na terra de salvação que, desde o princípio, Deus rico de misericórdia prometeu à humanidade.


Modelo insuperável do povo remido, no caminho rumo ao cumprimento desta promessa universal, é Maria, "Aquela que acreditou, porque vai acontecer o que o Senhor lhe prometeu" (Lc 1, 45).  Filha de Abraão segundo a fé e a carne, Maria participou pessoalmente na sua experiência. Também Ela, como Abraão, aceitou a imolação do Filho, mas enquanto a Abraão não foi pedido o sacrifício efectivo de Isaac, Cristo bebeu até à última gota o cálice da amargura. E Maria participou pessoalmente na provação do Filho, acreditando e esperando com firmeza aos pés da cruz (cf. Jo 19, 25).


Era o epílogo de uma longa expectativa. Formada na meditação das páginas proféticas, Maria pressentia o que estava à sua espera e, exaltando a misericórdia de Deus, fiel ao seu povo de geração em geração, exprimia a pronta adesão ao seu desígnio de salvação; expressava de modo especial o seu "sim" ao evento central daquele projecto, o sacrifício daquele Menino que Ela trazia no seio. Como Abraão, aceitou o sacrifício do Filho.


Hoje, unimos a nossa voz à sua e, juntamente com Ela, a Virgem Filha de Sião, proclamamos que Deus se recordou da sua misericórdia, "conforme prometera aos nossos pais, em favor de Abraão e da sua descendência para sempre" (Lc 1, 55).


Trecho da Homilia do B.João Paulo II - 23 de Fevereiro de 2000,
recordando Abraão, Pai de todos os crentes.

Fonte : Santa Sé.

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